A chave da questão não está em quem investiga, mas sim no financiamento das estruturas policiais para o comprimento de seu mister. A polêmica causada no seio dos órgãos do sistema de Justiça Criminal sobre a possibilidade de exclusivisar as prerrogativas de exercício de investigação criminal para as policias judiciárias, tem alcançado outros extratos periféricos da sociedade e já tem causado confusão na cabeça de muita gente. Primeiro por ser o Brasil o país que detém os mais alarmantes índices de criminalidade e violência do mundo, tendo a maior taxa de homicídio por 100 mil habitantes na América Latina. E também o Brasil é o único país que opera o sistema de Justiça Criminal no modelo mais antigo do planeta, sem a necessária eficácia , efetividade e eficiência que tanto espera a sociedade, que vive em sobressaltos com a sensação de impunidade diante do risco de ser vítima a qualquer momento. É aqui também onde se diagnóstica maior distorção e discrepância, com diferença de tratamento entre órgãos com a mesma importância criminal. O Judiciário e o Ministério Público têm independência funcional e orçamentária com dotações próprias, salários que chegam ao sub teto e liberdade para autorizar a realização de concursos quando os quadros se tornam vacantes. Por outro lado, as Policias, o Sistema Prisional e a Defensoria Pública amargam com a míngua de recursos, meios e efetivos para cumprir o seu mister de prestar segurança pública, preservação da ordem, repressão qualificada, encarceramento e execução da pena com vistas à ressocialização. No caso da Defensoria Pública, a despeito dos poucos mais de 500 defensores para atender uma população de mais de 20 milhões de mineiros em 853 municípios, esta já adquiriu e conquistou a sua autonomia orgânica e financeira, descolando-se das precariedades do “ vale de lágrimas ” do Poder Executivo.
Esse breve intróito e reflexão foi feito para justificar o posicionamento de vários dirigentes sindicais do movimento sindical da segurança pública, em especial do SINDPOL/MG, em criticar o momento em que se apresenta, discute e reivindica-se a exclusividade da investigação criminal por parte das policias do Brasil, pois o grande problema não está em quem investiga, mas sim na capacidade que um órgão tem de desempenhar minimamente as suas prerrogativas e atribuições de quem detém os cargos.
Nesse sentido, ao invés do Ministério Público reivindicar para si atribuições constitucionais das policias judiciárias, deveria este órgão, resultado da conquista e da luta do povo brasileiro, exercer seu papel de fiscal da aplicação da lei e zelar pelo bom funcionamento das forças policiais dos mais longínquos rincões dos estados, primando pela locação apropriada dos recursos orçamentários, fiscalizando as condições inadequadas de trabalho, a ocorrência do desvio de finalidade e usurpação de função praticado por outros órgãos que, ignorando o texto constitucional atropelam as atribuições das policias judiciárias e eivam de vícios atos próprios de policiais judiciários, expondo a riscos os princípios da cidadania, da dignidade da pessoa humana, da regularidade processual e da segurança jurídica.
Também observamos, com muita reserva e as vezes até espanto, a defesa que alguns dirigentes policiais fazem dessa PEC que nada de novo inaugura em sua textualidade, pois o que ela enseja já está previsto no texto constitucional em seu artigo 144 desde sua promulgação, ou seja, é “chover no molhado”. A verdade é que o advento de apresentação dessa PEC tira do foco a real importância do debate sobre a segurança pública que é a reformulação do modelo e o financiamento do sistema, pressupostos esses que se encontram verdadeiramente arquivados no Congresso Federal, no Ministério da Justiça, nas Secretarias de Segurança Pública dos governos estaduais e nas Assembleias Legislativas; a PEC 24 do Senador João Capiberibe que prevê a criação do fundo nacional de segurança pública, estabelecendo uma cota mínima tributária para o financiamento dos órgãos policiais; PL 1949/2007 que estabelece a lei geral das Policias Civis, a lei orgânica da Polícia Federal; as PEC’s 300 e 446 que criam o piso salarial nacional para os policiais civis e militares; o PLC 23/2012 que cria a nova lei orgânica da policia de Minas Gerais, reivindicação verdadeira dos operadores da Polícia Civil e de toda sociedade já há mais de 44 anos, e tantos outros projetos como a PEC 534 que trata das guardas municipais, a PEC 308 que trata da política carcerária do Brasil se encontram todos parados, sem qualquer discussão por quem deveria garantir a sua efetividade.
É preciso descortinar o que está verdadeiramente por trás de tudo isso, a quem interessa a hipertrofia de poderes do Ministério Público? Ou ainda a quem interessa a limitação dos poderes do mesmo? Ainda nessa mesma esteira, por que os delegados de policia não reivindicam valorização e fortalecimento para todos os policiais civis? Será que sozinhos são capazes de promover segurança pública. É fundamental que neste debate entendamos que, a investigação não é atividade que se encerra em si só, ela é um instrumento poderoso nas cearas administrativas, cíveis e nas relações entre os órgãos públicos na busca de vícios, erros distorções, irregularidades e práticas ímprobas. Ela é também uma importante ferramenta para a busca da verdade e informação através dos veículos de imprensa esclarecendo de forma republicana o dia-a-dia da vida em sociedade. Porém, quando da sua aplicação na ceara criminal, a investigação deve ser tratada com critérios e princípios rígidos e formais, pois, o que está em jogo são bens jurídicos de incomensurável valor, não podemos jamais deixar o Poder Público negligenciar com uma vida, o patrimônio e a liberdade. Por tudo isso, os órgãos que exercem o poder de investigação devem ser priorizados e fortalecidos por parte do Poder Público sob pena de se revelarem ineficazes deixando a sociedade e o patrimônio público reféns de toda sorte de criminalidade, especialmente aquela que se manifesta de forma organizada praticando fraudes, corrupção, tráfico de drogas,tráfico de influências e locupletação em larga escala. Desconsiderar isso e o estado de sucateamento e vulnerabilidade pelo qual atravessa as policias judiciárias no Brasil é mais que oportunismo e vaidade, é má fé. A PEC 37 talvez, mas, primeiro, a mudança do modelo, conjugado com a modernização, a valorização e o financiamento justo, equânime e isonômico entre os órgãos do sistema de segurança pública e justiça criminal.
DENILSON APARECIDO MARTINS,PRESIDENTE DO SINDPOL/MG.
FONTE: SINDPOL/MG.
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